Fernanda Saad usando uma máquina de escrever em um jardim, simbolizando a escrita de uma carta de encorajamento para mulheres que moram fora e estão se sentindo perdidas e inseguras.
Morando Fora

Carta pra quem tá morando fora

Oii meninas, palavras de forças pra quem anda angustiada, perdida, cansada e se perguntando “que que eu tô fazendo da vida”.

Eu mudei aqui pra austrália já faz 18 anos e penso muito em vocês, dando passos que eu dei há muito tempo atrás, convivendo com as mesmas angústias, tendo os mesmos tipos de questionamentos.

E é o tipo de coisa que quem não vive, não entende. A gente se sente sozinha porque morar fora é um puta sonho e é realmente um privilégio, mas nem por isso é fácil.

A gente é jogada num outro mundo, com outro idioma, outro jeito de viver, de lidar com problema.

Demora pra gente aprender os códigos sociais, nos sentimos peixe fora d’água e gastamos uma energia enorme pra fazer o básico porque tudo é novo, tudo é desafio.

Nesse processo, a gente muitas vezes até esquece do porquê acabamos aqui.

“Vale mesmo a pena tudo isso? É mesmo a melhor opção abrir mão de tudo o que eu tinha pra trabalhar feito uma fdp, gastar rios de dinheiro com visto, me sentir sozinha o tempo todo, sempre precisando me desdobrar em mil pra dar conta do mínimo?”

Claro, essa resposta é individual e não tem manual de instrução. Mas, no fim, se a gente fosse do tipo que gosta de percorrer os caminhos já conhecidos, a gente não estaria aqui né?

Eu sempre penso que quem se joga nessa aventura de ir morar longe de casa é quem tem um desejo de se conhecer.

Porque sim, a gente viaja pra ver o mundo, mas quem a gente realmente conhece são as nossas diferentes versões em cada um desses novos universos.

Nós vamos navegando por partes nossas que nunca exploramos, nos propomos a viver de formas que nunca imaginamos, crescemos de jeitos que nunca esperamos – e isso dói.

Essa experiência, por mais rica e linda e profunda que seja, ela é doida. Ela traz muitas rupturas, ela nos leva pra lugares emocionais assustadores porque questionamos tudo… nosso passado, nosso presente, nosso futuro.

A gente não sabe mais quem a gente é, nem quem a gente vai ser.

E eu não conheço a maioria de vocês, mas falo isso com confiança porque o ser humano ama uma novidade, mas também sofre com a incerteza do desconhecido.

O que eu queria com essa cartinha era acolher essa angústia de vocês, como alguém que já viveu essa montanha russa doida, e falar que faz parte.

Nesses momentos, é fácil a gente duvidar de nós mesmas… da nossa capacidade, da nossa força, das nossas escolhas.

Como mulheres, rapidinho a gente tá se culpabilizando, achando que o problema é com a gente.

E não é não. É uma experiência difícil mesmo.

Além de acolher, queria te lembrar do quanto você teve que ser forte e determinada pra chegar até aqui. Porque ninguém chega do outro lado do mundo “sem querer”, sem esforço.

Todo mundo aqui teve que investir muito tempo, energia, dinheiro pra atravessar o oceano.

Todo mundo aqui deixou pra trás pessoas, projetos, futuros.

Todo mundo aqui topou abrir mão do que tinha pra buscar o que faltava.

E você é muito incrível por isso. Você é forte, determinada e, sim, muito capaz.

Por mais que você se cobre um monte (porque eu sei que se cobra, afinal você mulher e é isso que a gente faz), se dê crédito também. Dá um pouquinho desse amor todo que você carrega pelos outros, pra você também.

Não nos conhecemos, mas de muitos modos percorremos as mesmas estradas.

Então deixo aqui meu amor, minha confiança em você e um abraço bem apertado, bem brasileiro pra quem tá precisando de um pouquinho de afeto.

Um beijo meninas